Por que Jesus chamou a mulher cananeia de cachorrinha?
Você Pergunta: Uma passagem da bíblia que sempre me deixou meio indignada é quando Jesus chama uma mulher de cachorrinha. Sempre me pareceu meio ofensivo isso da parte de Jesus. Você pode me ajudar a entender melhor esse texto, o que ele significa, se Jesus realmente disse uma palavra ofensiva àquela mulher cananeia, chamando-a de cachorrinha?
Uma leitura mais superficial do texto de Mateus 15:21-28 certamente nos dará a impressão de que Jesus foi muito duro e até ofensivo diante da dor da mulher cananeia. Mas será que é isso mesmo que os detalhes do texto nos mostram?
Ao examinarmos com atenção os versículos e o contexto cultural e linguístico da época, percebemos que há uma riqueza de significados por trás da fala de Jesus.
Este estudo busca mostrar como a mensagem de Jesus, mesmo utilizando uma metáfora que, à primeira vista, parece depreciativa, revela de forma poética o foco de Sua missão e a superação das barreiras entre israelitas e gentios.
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Por que a mulher cananeia foi chamada de “cachorrinha”?
O significado de “Cão” nos tempos bíblicos
No contexto dos tempos bíblicos, o termo “cão” não possuía o mesmo significado afetuoso que muitas vezes atribuímos ao animal atualmente. De fato, o cão era considerado um animal impuro, e chamar alguém de “cão” era uma forma figurada de desprezo ou ofensa.
Um exemplo claro dessa linguagem pode ser visto no relato de 2 Samuel, onde Abisai, filho de Zeruia, repreende alguém de maneira similar:
“Então, Abisai, filho de Zeruia, disse ao rei: Por que amaldiçoaria este cão morto ao rei, meu senhor? Deixa-me passar e lhe tirarei a cabeça” (2 Samuel 16:9).
Essa passagem evidencia que a expressão “cão” era usada para denotar inferioridade ou desvalorização, especialmente quando se tratava de gentios, ou seja, pessoas que não pertenciam ao povo de Israel.
Portanto, é importante compreender que, embora à primeira vista a fala de Jesus possa parecer ofensiva, ela se insere em um contexto cultural onde tais expressões eram comuns e carregavam um significado simbólico.
O encontro de Jesus com a mulher cananeia
Em Mateus 15, Jesus viajava pela região de Tiro e Sidom, áreas marcadas pela presença de idolatria e práticas pagãs. Nessa rota, uma mulher cananeia, que não fazia parte do povo de Israel, soube da fama de Jesus e foi em busca Dele, movida pelo desespero e pela esperança de ver sua filha curada, que estava atormentada por um espírito maligno.
Quando finalmente a mulher se encontrou com Jesus, ela o adorou e clamou pela cura de sua filha. Mas a resposta de Jesus surpreendeu:
“Então, ele, respondendo, disse: Não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos” (Mateus 15:26).
Nesse momento, a expressão “cachorrinhos” poderia ser interpretada como uma ofensa à mulher por sua condição de gentia, reforçando o desprezo cultural que os judeus tinham pelos não israelitas.
Contudo, ao analisarmos com profundidade, percebemos que há uma intenção muito mais complexa e sutil na resposta de Jesus, inclusive, percebida pela mulher cananeia!
O propósito da metáfora e a missão de Jesus
Jesus utiliza a metáfora do “pão” para ilustrar o propósito inicial de Seu ministério: levar a mensagem do Reino de Deus primeiramente ao povo de Israel, os “filhos”. Nesta linguagem familiar, Jesus se coloca como o provedor – aquele que tem o “pão” –, o que simboliza a palavra e a bênção de Deus. Ele disse:
“Não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos” (Mateus 15:26).
Ele estabelece, de forma simbólica, que Sua missão estava direcionada, num primeiro momento, aos israelitas, aqueles que, em Seu ministério terreno, eram os recipientes prioritários da revelação divina.
A suavidade na escolha da palavra “cachorrinhos”
Embora a palavra “cachorrinhos” (do grego kunarion – pequeno cão) possa parecer ofensiva, é relevante destacar que Jesus a utiliza de forma a suavizar o termo “cão”. Ao empregar a palavra dessa forma (em um tipo de diminutivo), Ele não adota a intenção usual de desprezo absoluto, mas sim uma metáfora que remete à imagem de um cãozinho domesticado, aquele que está perto da família e que, embora receba apenas as migalhas que caem da mesa, ainda assim é amado.
Essa escolha semântica revela que, mesmo com a aparente dureza da fala, Jesus tinha em mente uma mensagem de inclusão e esperança.
A resposta da mulher cananeia e o diálogo poético
A mulher cananeia, em sua sabedoria e humildade, compreende a metáfora que Jesus emprega e não se deixa abater pela resposta inicial de Jesus. Em vez disso, ela responde com fé e perspicácia, utilizando a mesma imagem para enfatizar a sua confiança na misericórdia de Deus.
Ao replicar a metáfora, ela sugere que, embora ela receba apenas as migalhas que caem da mesa, sua fé a torna digna de receber tudo o que Deus tem a oferecer. Sua resposta, impregnada de humildade e persistência, é reconhecida por Jesus:
“Então, lhe disse Jesus: Ó mulher, grande é a tua fé! Faça-se contigo como queres. E, desde aquele momento, sua filha ficou sã” (Mateus 15:28).
A atitude da mulher cananeia, ao responder com fé e usando a mesma linguagem simbólica, demonstra que ela não se ofendeu com a metáfora, mas entendeu que a mensagem de Jesus transcende barreiras culturais.
Ao responder com firmeza, sabedoria e fé, ela conquista o coração de Jesus, evidenciando que a bênção de Deus não se limita a um grupo específico, mas está disponível a todos, inclusive aos gentios.
Implicações teológicas e a inclusão dos gentios
O diálogo entre Jesus e a mulher cananeia é muito mais do que um simples teste de fé; ele prenuncia uma verdade profética. Ao permitir que o exemplo da mulher seja reconhecido, Jesus demonstra que, apesar das dificuldades e tensões históricas entre israelitas e gentios, o amor de Deus se estende a todos.
Esta passagem, portanto, não é um ato de exclusão, mas sim um convite à inclusão, abrindo caminho para que os gentios também possam receber as bênçãos que, até então, pareciam restritas ao povo de Israel.
Ao utilizar a metáfora dos “cachorrinhos”, Jesus, de forma poética e reveladora, ensina que os gentios, mesmo que inicialmente vistos como “além da mesa” dos filhos, podem ser acolhidos na família de Deus.
Essa abordagem inovadora e transformadora é um dos pontos centrais do ministério de Jesus e prefigura a missão da igreja, que viria a levar o evangelho a todas as nações.
Conclusão
Ao analisarmos a passagem de Mateus 15 à luz do contexto cultural, linguístico e teológico, percebemos que a fala de Jesus não foi um insulto gratuito, mas uma metáfora cuidadosamente escolhida para enfatizar o foco inicial de Sua missão e, ao mesmo tempo, abrir as portas para a inclusão dos gentios.
A resposta da mulher cananeia, cheia de fé e compreensão, ilustra como a persistência e a humildade podem transformar situações aparentemente negativas em momentos de revelação e graça divina.
Este episódio nos ensina que, mesmo diante de expressões que à primeira vista podem parecer duras ou ofensivas, o coração da mensagem de Jesus é sempre o amor, a compaixão e a oferta de salvação para todos.
Assim, somos convidados a olhar além das aparências e a buscar, em cada palavra de Cristo, a profundidade do Seu amor e a amplitude de Sua missão redentora.
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